A
história universal é a história do espírito. A vida e a morte das nações, as
trocas, lutas e conquistas, fazem aparecer um desenvolvimento absoluto. Um
tesouro vai crescendo sem parar, e sem parar se renova sem nada perder de si
mesmo; Todo o homem nele se reconhece, ou antes nele reconhece que a sua
própria natureza se ultrapassa a ela mesma. A religião é como o centro dessa
cultura absoluta; mas é a arte que anuncia a religião e é a filosofia que
compreende que o desenvolvimento que vai
da arte à religião se faz no interior do espírito. A arte é como o nascimento
do espírito absoluto. Na extrema confusão dos pensamentos, e no meio das
contradições em que a alma se combate a si própria e se divide a si própria, o
eterno aparece; é a obra de arte. Cada um compreende essa linguagem universal
bem melhor do que a sua própria língua. Essa grande escrita diz primeiro tudo e
responde a tudo. Tal é primeiro o deus. E
será sempre o deus que não se discute. Neste sentido a arte supera a
religião e esclarece-a sempre duma certa
maneira. Porque essa harmonia sentida na obra de arte entre o baixo e o alto,
entre a natureza e o espírito, realiza a prova ontológica, e de antemão
assegura os nossos pensamentos. Mas por outro lado, a obra de arte é
enigmática; a expressão nela ultrapassa a forma. Assim, o deus é interrogado e
deve prestar contas dessa força que exerce; o pensamento que se desenvolve
assim por uma meditação sobre a arte, é a religião; e a dialéctica própria da
religião faz entrar na história mesma a arte imóvel. A história da arte é assim
um esboço da história da religião. Mas não é a religião mesma que escreve essa
dupla história. Toda a religião é enigma por sua vez, tanto quanto a tomamos
como um acaso. Só a filosofia reconhece em toda a arte um momento da religião,
e na religião um momento do espírito absoluto. De resto a filosofia é ela
própria história, e, poder-se-ia dizer, história da história, neste sentido que
toda a história se reflecte e reúne nela, mas sempre num desenvolvimento sem
fim; e aqueles a quem isso surpreende não sabem o que é o espírito.
Alain
(Tradução de José Ames)
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